Quatrocentos Reis de Lembranças
Eu era mesmo muito pequena, mas lembro a moeda de quatrocentos réis. Tinha um desenho de locomotiva e me comprava balas no pequeno botequim da esquina da travessa, lá bem onde a travessa acabava. Comprava confeitos de amêndoas glassadas de açúcar - esses mesmo que hoje custam muito caro, pois que são importados. E também eram importados quando eu era pequena. Como importada era a louça em que eu comia, e meu pequeno copo articulado de levar na bolsa de crochê. E tudo isso era importado porque havia pouca indústria por aqui. Meu avô e meus tios trabalhavam numa dessas poucas: eram metalúrgicos, eu acho, operários.
E havia pouca indústria e o comércio era pequeno lá onde eu era pequena enquanto morava...
... e a vida... vivia, e era vivida por todos com pouco luxo, muito limite, gasto pouco. O que era muito? Família, sentido de família e mesa farta. Sem desperdício.
"Quem come e guarda, duas vezes põe a mesa."
"Quem dá o que tem, a pedir vem."
Ditos de meus avós. Controlados.
E por isso eu comia em porcelana inglesa... e por isso eu tinha a moeda de locomotiva vez em quando para comprar meus confeitos de amêndoa importados...
... e tinha meu copo articulado de levar na bolsa de crochê.
Ilnea
Cópia de texto encontrado em 01/04/2oo2,escrito no final do século XX