Dourar a pílula
Esta expressão me intrigava quando eu era pequena. O que afinal quereria dizer? Pois que de pílulas conhecia umas pequeninas, vermelhas, que minha avó costumava tomar e eu não sabia para que. Só sabia que crianças não deviam sequer se aproximar delas. À medida de crescer, fui descobrindo, par e passo, seu significado. Afinal, vez em quando, também a mim me davam pílulas - se não douradas - cobertas de açúcar para disfarçar o amargor do contido. E aprendi, mordendo a fina e enganosa camada doce, que "dourar a pílula" se traduzia em "enganar o trouxa", "vender gato por lebre" e sinonímias outras mais chulas e contundentes.
Aprendi? Bobagem! Aprendi coisa nenhuma! Os douradores de pílulas não só se multiplicaram como se sofisticaram, penetrando sendas inimagináveis. Para citar um indigesto exemplo, os defensores das matas e dos animais silvestres - não que não os haja sérios e conscientes - reunidos em ONGs de origem duvidosa e secretarias de nome pomposo, gritam contra a internacionalização da Floresta Amazônica, choram pela Mata Atlântica agonizante, mas fecham olhos quando construtoras, mesmo não autorizadas, devastam árvores, seu ecossistema e o próprio terreno que as sustenta.
Ainda que amplamente denunciado aos "órgãos competentes," isso é o que vem acontecendo no n.º 123 da Rua Vereador Duque Estrada, em Santa Rosa, onde uma retro-escavadeira e no mínimo seis caminhões basculantes trabalham das 7 às 17 horas, destruindo e levando embora o que possa vir atrapalhar a construção de ninguém sabe o que. O responsável? Quem sabe? No portão escancarado nenhuma placa o indica.
Sábado passado, um pássaro coloria o encarte de lançamento do condomínio a ser construído na Rua Itaguaí, próximo ao Centrinho: um Sabiá Laranjeira, símbolo do Brasil... pintado de azul. É... já não se douram pílulas como antigamente.
P.S.
Revirando antigos emails, encontrei vários contendo artigos publicados no "O Crreio". A data é 12/04/2001. Olhando, agora, do meu portão ainda vejo tres casas como as tantas que encontrei quando vim morar aqui. O resto do quarteirão não é mais que uma parede de edifícios escondendo o verde da terra e o azul do céu... o resto, um canteiro de obras. Sinto...
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